Estou em Vale de Cambra de visita aos meus sogros. O Paiva está demasiado perto e eu ali a pressionar no comando da televisão. Deambulo entre a RTP Memória e o Canal Panda. O caiaque na garagem parece que está inquieto. Quase o oiço implorar "Então? Vens dar uso à minha chaparia ou continuas aí encostado no sofá?". E o Paiva ali tão perto....Espero pelo momento oportuno para dizer à minha cara-metade que vou ali e já volto, mas ela não vê os pais há algum tempo, tenho de ser paciente. Vai sair com a mãe para as compras. Chega das compras e vai levar o pai a passear; ...é agora! ...vou-me pirar..."querida, achas que...", ...fui interrompido..."Olha vou agora com a minha mãe ali visitar a minha tia!",... E o paiva ali tão perto...porra! Voltou da tia e é desta! ...agora poderia ficar com os cachopos enquanto eu,..."olha Miguel só agora me lembrei que tenho de ir ali à Hermínia, a minha amiga que fez anos. Ficas aqui com os miúdos?"..."Concerteza, meu amor..." . O caiaque continuava a contorcer-se de impaciência, mas não havia nada a fazer, estava de baby-sitting a tempo inteiro, ou seja, sem tempo para ir ao paiva que estava ali tão perto. Epá tens de te impor! Quando ela voltar da Hermínia diz-lhe que vais ali comprar um maço de cigarros e já voltas...mas...eu nem fumo?...pronto uma caixa de pastilhas gorila...mas as gorila não vêem em caixas...umas tridente vá...
A coisa funcionou. Meti-me no carrito, o caiaque lá em cima aos saltos e lá fui eu para a minha terapia mensal. Não tinha a companhia do pedro (que recuperava a sua canela de mais um ataque a um infeliz que lhe quis dar uma naifada) e do jorge(que devia estar a acartar mais uns baldes de massa), mas como eu precisava de meter as ventas no líquido, lá fui alegre e contente. Repito aquele momento de prazer solitário há alguns anos e o gozo continua a mesmo. Chego à ponte de Espiunca, pego no caiaque e vou subindo o rio até ao rápido dos 3 saltinhos, onde permaneço às cambalhotas o tempo que as minhas capacidades e artroses suportarem o esforço e o frio da água. Perguntar-me-ão os mais entendidos: "Epá e que manobras fazes?" Não sei nem me interessa. Aquele é um momento em que apenas me sinto bem. Dentro duma massa de água que suga o caiaque com a força que tem, para o libertar na direcção que acha mais conveniente. A água que me percorre dos tímpanos até ao intestino delgado; que me entra a cem há hora pelas narinas e dá 4 voltas à massa encefálica. É o burburinho da água, o sol na cara, a sofreguidão depois de uma submersão mais demorada. E ninguém ali para testemunhar as minhas voltas nas voltas da água. Sou só eu o líquido e uns quantos calhaus à espera que me descuide.
Subo o rápido e remo até ao outro lá mais acima. Depois desço e volto a ficar ali nas minhas cambalhotas. Ouço um assobio. É um pastor com as suas cabras escaladoras ali metido no penhasco a observar e a pensar que tipo seria aquele que se estava a autoflagelar entre a água e os calhaus. Depois de 50 minutos, tinha de me põr em pé; já me doíam os joelhos. Desci do caiaque, baixei-me um pouco e as minhas costas gritaram em uníssono: " Toma lá com esta lombalgia que é para veres se te lembras de ficar em casa a pressionar o comando em busca de algo melhor do que o canal memória!". Meti-me todo empenado dentro do barco e lá me fui arrastando até à ponte para ver se conseguia pôr a custo o caiaque em cima do tejadilho do carro. Malditas costas! maldita ginástica na adolescência!...Maldito voleibol!..maldito canal memória! Tens de te deixar destas merdas... Foi então que me lembrei dos melindres que iria trincar em Arouca . Parece que as costas já me doem menos um bocadinho...
As fotografias foram tiradas numa época longíqua (cerca de 10 anos atrás) em que a minha esposa ainda me fazia companhia. Ela levava o seu livro e eu levava com água no toutiço. Agora se eu quiser fotografias tenho de chamar o pastor ou uma das cabras escaladoras.