domingo, 3 de maio de 2009

O Regresso do Eremita


Era uma vez um reino bué, bué longe, onde havia um rio bué, bué inóspito, onde a água era bué, bué escassa, o acesso era bué, bué íngreme,…então quando é que aparece o Shrek, pá?,…..o desapontamento foi bué, bué grande. Depois fomos para outro reino bué, bué longe, para outro rio bué, bué giro,…nunca mais aparece o raça do Ogre e a princesa Fiona?....onde remámos bué, bué e mais bué, caminhámos sobre carris bué, bué de tempo, acartámos caiaques bué, bué pesados, chegámos ao carro bué, bué tarde, dissemos bué, bué asneiras…Mas o Ogre aparece ou não??? Qual Ogre qual carapuça! A história de hoje vai trocar um papão que come criancinhas ao pequeno almoço e dá bufas malcheirosas por 4 patos que foram papados por dois magníficos barretes e dão bufas malcheirosas(?).

Águeda Internacional - expectativas furadas
Tua – um pesadelo em forma de rio
Paiva - Um cheirinho de rio com sol de verão


A equipa outra vez junta

O regresso aconteceu! Ao fim de 10 anos de secura de rio, eis que Jorge Reis, companheiro de míticas aventuras, utilizador compulsivo de fio dental, coleccionador de sacos de plástico do continente, devorador de cebolas cruas, voltou às lides. Mandei-lhe um toque, convencido que iria levar mais uma nega, quando a resposta inesperada surgiu entre dentes “é uma hipótese”. Estava aberta a brecha para oportunidade do homem voltar ao rio. Acenei-lhe com uma aventura à moda antiga, um rio desconhecido e pouco acessível, regime de autonomia e latas de atum. A reviravolta deu-se e embarcámos novamente os quatro em direcção ao Águeda internacional. Mapas na mão, estudo dos poucos acessos e esperança de um caudal aceitável, lá fomos na noite da véspera, para iniciarmos a descida cedinho.


Quando ainda havia esperança...


...a esperança foi-se com a falta de líquido...



Desta vez não tínhamos nenhum apoio por terra; parece que a última experiência do João foi de tal maneira traumatizante que fugiu para a Serra Leoa e nunca mais foi visto. Acampámos num qualquer canto algures perto do rio e desta vez fiquei a chonar no carro, longe da tenda do Jorge Justino. Achei que tinha chegado a altura de não proferir mais nenhum comentário sobre uns ruídos proferidos durante a noite, para não bater mais no ceguinho, logo não vou contar a parte do ressonar que conseguia transpor os vidros herméticos do meu veículo e ecoava no interior dos meus tímpanos flagelados.

Tenda Durex

Acordámos cedinho e já o Jorge Reis tinha posto a sua banca multivitamínica sobre o caiaque composta por tomates crus, ovos cozidos, cereais, fruta, tâmaras tunisinas e bolinhos feitos pelo filho. Misturou aquilo e conseguiu ingerir tudo, qual Ogre, na hora do massacre. O envolvimento era fabuloso, como fabulosa era a nova tenda do Justas em forma de preservativo. Descemos até ao rio sem caiaques para nos depararmos com o que já tínhamos percebido de longe…muito poucachinha água. Ao inspeccionar um rápido sifonado, a máquina saltou-me do bolso e foi mergulhar no leito com o intuito claro de se suicidar no meio dos calhaus; já não conseguia suportar mais ser maltratada pelo dono. Posteriormente, depois de uma reanimação ao sol, percebeu-se ser anfíbia.



A mixórdia matinal


Para onde a minha máquina queria nadar...


tomatinho entre ovinhos


Caminhámos cabisbaixos percorrendo a íngreeeeeeme subida e, chegados ao carro, decidimos que iríamos descer um rio mais à mão que nenhum de nós tinha feito; o rio Tua. Entrámos na ponte de Brunheda e começámos a remar o “inferno branco” como alguém lhe chamou. O inferno existia de facto, e, curiosamente, também existiam muitos poléns brancos a esvoaçar junto às narinas. Remámos que nem uns Ogres, ou antes, que nem uns camelos, para irmos encontrando espaçados, alguns rápidos engraçados. Lembrámo-nos por momentos das intermináveis aquecidelas do Guadiana. A paisagem era realmente muito bonita e as enormes escarpas laterais vaticinavam a sina “se quiseres sair daqui vais ter de caminhar muito”.



No inicio só flores...



depois foi remar...



remar...



P´ra cortar a monotonia







Apeadeiro para lembrar...ou esquecer...

E assim foi. Cansados da euforia do rio, e com a hora a ficar para o tarde, decidimos sair no apeadeiro abandonado da linha do Tua chamado Castanheiro. Escondemos os barcos e seguimos a pé por cima da linha do comboio para irmos buscar o carro. A caminhada fez-se de passo condicionado pela largura dos carris, mas mesmo com esse empeno, a paisagem era fabulosa: belos seixos entre barrotes de madeira, apertados entre dois carris, davam um cunho romântico ao esforço, isto porque se retirássemos os olhos dos ditos barrotes os pezinhos ir-se-iam queixar muito. Apesar da Locomotiva Castro ter imposto um ritmo alucinante aos seus vagões, demorámos duas horas a chegar ao carro, com a certeza de que poucos conheceriam melhor a linha do Tua do que nós. Entre as discussões finais, vinha a questão se o barrote 2543 seria mais bonito do que o barrote 4187, havendo sempre alguém a dizer que o parafuso ferrugento é que dava beleza ao barrote 11430. Mas se a caminhada assumiu contornos de profunda autoflagelação, o que viria a seguir daria cabo do resto.



128 barrotes...
673 barrotes...

1850 barrotes às escuras...


Muitos barrotes depois...


Ajudados por um senhor local encontrámos o difícil acesso em terra batida ao apeadeiro do Castanheiro. “Mas o vosso carro não vai lá abaixo!” garantiu o senhor. Fomos descendo de carro até onde a sua tracção aguentou, mas chegou um ponto onde não dava mais. E esse ponto era bué, bué longe do rio. Demorámos muito tempo a descer com as articulações a ranger e, já de noite, começámos a acartar os Ogre de plástico com toda a roupa molhada dentro, por ali acima. Desculpem, mas esta parte eu quero esquecer, como tal ficará aqui apenas este hiato,..........................................................................................................................................................
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....................................................E, pronto. Chegámos à carripana às onze da noite, com a certeza que pior do que aquilo só ser papado por um Ogre verde esfomeado. O inferno branco afinal tinha-se revelado como um lamentável inferno negro.



Sem forças para libertar uma bufa... talvez o "peido mestre"


Estávamos nas últimas, as nossas células pedinchavam um naco de carne e muita gordura, mas a grande questão seria a de saber onde se poderia trincar chicha àquela hora. Encontrámos um sítio em Alijó que faz francesinhas até às duas da matina e aspirámos aquela pasta hipercalórica em menos de meio fósforo. Ainda ouve alguém que chegou a dizer que o molho tinha um sabor a puxar para o azedo, mas ninguém se importou.



Acampámos algures e acordámos todos partidos sem grande ânimo para mais barretes. Olhámos no mapa e, desconfiados que a água não abundaria nos rios do Minho e arredores, decidimos rumar a casa e a caminho dar uma mergulhaça rápida no Paiva. Agora seria aquela parte em que se faria referência aos sacos de plástico espalhados pelo carro fruto da sensibilidade que Jorge R tem para a arrumação mas, no sentido de preservar a sua presença na equipa em futuras descidas, vou apenas dizer que o tipo até é muito arrumadinho e aquela casca de ovo que ficou colada nos meus calções não veio do interior de uma das suas 4 caixas de plástico perdidas no veículo . Ia pensando se não tinha enganado o Jorge quando lhe afiancei que a aventura era “à moda antiga”. De facto, antigamente também metíamos grandes barretes e levávamos grandes aquecidelas, mas não havia net, nem guias de rios, nem boletins meteorológicos precisos.
Chegámos ao Paiva já tarde, e ao passar por cima da ponte de Alvarenga, vimos bué, bué malta a entrar no desfiladeiro. Estava a decorrer o festival do Paiva, com forte adesão. Optámos por fazer a micro-etapa do Vau-Espiunca para regressarmos cedo a casa. O tempo esplendoroso, calor de verão, fez com que entrássemos no rio de fato de banho, sempre com o olhar atento do Pedro e do Jorge em busca da minha barriga proeminente, para me confrontar com as ténues adiposidades similares às deles. Claro está que, apesar do esforço, os consolidados abdominais, não deixaram margem para gozo com a barriga alheia. Apenas tive de suster a respiração sempre que o olhar apontava na direcção.
O regresso do eremita



Barriga, eu???...Pronto ó Tarzan taborda, já podes parar de suster a respiração!!!




Kayakus Erectus






Quanto à descida, deu para reinar no caudal aceitável do Paiva , dispensando talvez a corrida final para ir buscar o carro desta vez acompanhado pelo Jorge Reis. A aventura, essa acabou como têm de acabar todas as aventuras à moda antiga: em frente de um prato com uma vitelinha grelhada, e batatas fritas afogadas na molhanga. Os 4 Ogres arraçados de patos, paparam a vaquinha arouquesa e viveram felizes para sempre….isto até alguém ter ousado soletrar a palavra CASTANHEIRO…